Novo recorde no mutirão de cidadania indígena: 3.476 atendimentos
Katu ahy pezur haw xe. Difícil de entender para quem não fala a língua guajajara da família Tupi-guarani, mas em português é simplesmente: “sejam bem-vindos”. Foi assim que o programa Escuta Ativa dos Povos Indígenas, do Tribunal de Justiça do Maranhão, e as 30 instituições parceiras do Programa Praça da Justiça e Cidadania receberam indígenas de várias etnias no mutirão de cidadania montado na Escola Municipal Santo Antônio, em Grajaú. E os números não negam a boa acolhida. Das 150 pessoas na segunda-feira, as marcas se superaram dia após dia. Nessa quinta-feira (15/5), um novo recorde foi estabelecido: 3.476 atendimentos para 1.793 pessoas.
Se somados os quatro dias, já são 8.766 atendimentos para 4.140 pessoas. E ainda tem esta sexta-feira, dia 16, com possibilidade real de ultraar a marca de dez mil atendimentos. A equipe do Ferj, órgão do TJMA que emite documentos por meio do programa Registro Cidadão e que tem prestado serviço para a Corregedoria Geral do Foro Extrajudicial, realizou 232 atendimentos nessa quinta-feira e um total de 647 atendimentos de segunda a quinta.
Angelânge Marizê de Sousa Guajajara (foto acima) teve um motivo forte para conseguir certidões retificadas. “Tem uma minha, que não tinha Guajajara, eu coloquei Guajajara. Aí foi preciso alterar dos meus filhos também, que não tinha Guajajara no meu nome nos registros deles. Eles tinham Guajajara, mas só que eu não tinha. Aí, como eu ajeitei o meu, que eu coloquei Guajajara, foi preciso alterar o meu nome nos registros deles também”, detalhou Angelânge, que ainda vai requerer a certidão do que aparece no colo dela. “Esse daqui é meu netinho”, revelou.
A juíza Adriana Chaves (à esquerda, na foto acima), ouvidora do TJMA para os Povos Indígenas – ela própria uma indígena de origem – não tem dúvida de que o mutirão já superou as expectativas, antes mesmo do fim, e se diz satisfeita com o que viu nesses quatro dias de atendimento, por ser uma forma de não acontecer com outras pessoas o que aconteceu com ela.
“Como pessoa que se autodeclara indígena, mas perdeu, ao longo da vida, o pertencimento de alguma aldeia, me sinto muito feliz, porque, por mais que eu tenha perdido este pertencimento, oferecer este tipo de serviço para a população indígena é uma forma de fortalecer a cultura desse povo, para que eles não percam, futuramente, sua tradição, sua cultura, sua língua, como eu perdi ao longo da minha existência”, revela.
E se o foco é a escuta, nada como ouvir em parceria. As ouvidorias do TJMA e da Funai têm trabalhado juntas no atendimento à população indígena. Josias Bento (de óculos, na foto acima), servidor da Ouvidoria do Tribunal, escutou de tudo nestes quatro dias.
“Dúvidas processuais, reclamações sobre morosidade – poucas, mas existiram – e, na maioria, só dúvidas, além de elogios ao trabalho dos servidores que estão nessa ação”.
VISITA ILUSTRE
O desembargador federal Roberto Veloso (à esquerda, na foto abaixo), coordenador dos Juizados Especiais federais, já conhecia Grajaú de perto no tempo em que morou na cidade. Mas nunca viu uma ação com tanta mobilização de órgãos municipais, estaduais e federais para ajudar as pessoas do lugar, especialmente indígenas.
Representando o TRF da 1ª Região, o magistrado não se limitou a participar apenas dos eventos para os quais foi convidado. Quis conhecer de perto o trabalho de cidadania praticado na escola. E a convite do juiz Rodrigo Nina (à direita, na foto acima), coordenador do Núcleo de Solução de Conflitos do TJMA, foi conhecer o ônibus da Conciliação Itinerante do Tribunal, que percorre os lugares mais distantes do estado para promover a cultura da paz, por meio de acordos.
O desembargador ficou impressionado com as possibilidades apresentadas a quem busca os serviços oferecidos no ônibus, que conta com um sistema de internet independente, para conectar pessoas em audiências a partir de qualquer lugar. Até comparou ao cumprimento da palavra que Jesus Cristo.
“Aqui se cumpre esta palavra. Primeiro, o amor ao próximo, porque nós estamos dando a oportunidade àqueles que estão relegados, invisíveis sociais, a se apresentarem e a conseguirem a efetivação dos seus direitos. Segundo: aqui, aquelas pessoas que são os mais carentes, elas têm condições de ar a Justiça. A oportunidade que nós estamos tendo de conhecer esse ônibus, que é o ônibus da conciliação, é algo fantástico”, elogiou o desembargador federal.
O magistrado também destacou a facilidade para uma pessoa ter o a um exame de DNA no ônibus. “Aqui também é possível se realizar gratuitamente. Então, não há um custo moral e, além disso, não há também um custo financeiro, porque o exame é feito de forma gratuita”, constatou.
Roberto Veloso falou sobre as audiências de conciliação, também sem necessidade de gastos. “Aqui há uma audiência pré-processual, antes do processo, e mesmo aqueles casos que têm processo, é possível se conciliar”.
Por fim, elogiou a união de órgãos de diversos segmentos. “As entidades, as instituições envolvidas estão de parabéns: a Justiça Federal, o Tribunal de Justiça do Maranhão, os juízes estaduais, os juízes federais, envolvidos em uma irmandade, porque nós fazemos um só Judiciário, o Judiciário Nacional”.
CONCILIAÇÃO ITINERANTE
Nessa quinta-feira, o projeto Conciliação Itinerante atendeu 213 pessoas, sendo 19 indígenas. Realizou 46 das 66 audiências designadas, com 28 acordos, o que representa 60,9% de conciliação alcançada do total de audiências.